Preciso arrancar minha cabeça fora. Abrir com um bisturi, e depois de escorrido todo o sangue que pulsa incontrolavelmente, olhar distante de mim mesma para achar nexo qualquer dentro das minhas entranhas. Como remontar tantas linhas que se entrepassam emaranhadas? Estou tomada, infestada de pensamentos que ousam nunca ir embora. Sem falar ainda das conversas imaginárias, aguardando um pouco mais de coragem.
Então, primeiro, Alberto, perante a você, vou abaixar minhas orelhas e pedir desculpas por ter sido tão ausente de ser suficiente para você. Juro que não foi de propósito. Quem não faz juras quando pede perdão, não é mesmo? Mas foi sem propósito, quase sem vida, que quando chegava em casa tarde da noite, não restava nada de mim para te responder. Nunca iria conseguir mostrar todo o zelo sentido quando não conseguia nem mesmo um abraço me dar. Te oferecer um monte de vazio de ser? Justificando minha ausência, justo o que você me disse que não queria ouvir.. Você quer que eu não ligue mais de volta e te deixe escorrer pela minha peneira e saia ressentido para longe de mim?
Em segundo lugar, Alberto, perante a você, escondido no mesmo nome, vou fazer diferente e vou te confrontar. Sexta passada, quando nós estávamos sentados na mesma mesa que todos os outros, seus olhos não passearam por mim como costumava fazer quando minha saia estava daquela altura. Você necessita da madrugada, e de tanta bebida quanto se possa aguentar para recorrer aos meus braços? Para me roubar um beijo audacioso e ansioso de mim.. Será que se eu te dou o meu mesmo bisturi, tentando olhar o emaranhado de sua cabeça, me encontraria lá? Talvez estaria afogada em cachaça.
Alberto, perante a você, preciso te agradecer por ter me feito superar minhas presunções ralas sobre amizade. Você me trouxe uma receita de família, que suja em farinha, acompanhada de todas as horas que pude dar a fermentação falha do meu pão, me aquecem a alma e me lembram de voltar a mim mesma.
Agora você, Alberto, que poderia me passar o nome de Alberto Júnior, que já me deu meu sobrenome, me fez gente e me trouxe pro mundo, quero desesperadamente te ver. Não posso. Desde de que virei gente crescida o meu tempo foi tirado de mim e os dias de descanso, nunca são de descanso de fato, são só de restauro. Já que não posso, me resta encarar o teto, desesperada para achar a força de vontade para voltar a realidade sem deixar o amargor do domingo tomar conta de mim e me paralisar novamente.
Não se sinta ofendido, Alberto, trago apenas desculpas tortas, não sei escrever cartas de amor. Minha letra é ríspida e desajeitada, como minhas palavras que aqui seguem, sobre um papel qualquer, manchado desse vinho barato. Nunca te disse dessa maneira, mas te amo Alberto. Nem sempre sou suficiente para mim, nem sempre estou inteira, nem sempre consigo estar acompanhada de você, mas clamo teu nome, me dê colo, imploro.
Temporona
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